domingo, 6 de março de 2011

Blocos, recuerdos y carnaval...



Sem qq motivo aparente, provavelmente levado por algum impulso desconhecido, desses q surpreende pelo próprio repente, ele abriu a porta do quarto e saiu dançando pela avenida, expondo em seu peito as batidas de um coração pierrot e apaixonado.

Mantinha seus braços abertos, como se quisesse abraçar aquele mundo de confetes e ilusões. Naquele dia não prestou tanta atenção nas fantasias. Só queria se espalhar nos espelhos das alegorias. No ritmo frenético do frevo se deixou levar na valsa das marchinhas de carnaval.

A lembrança, até onde me parece e a compreensão alcança, é muito mais q a projeção de um tempo percorrido. É uma aliança permanentemente guardada no peito. É desejo preso a uma saudade q não se escreve e nem se consegue conter com as linhas da escrita. A lembrança tem seus caprichos, muitas vezes feitos de rabiscos e sentimentos perdidos, por entre caixas altas e baixas de um teclado.

A lembrança é um registro impreciso q se desprende da alma e escorre pela tela, como em uma pele molhada, banhada de suor.


Qta alegria sentiu percorrer seu corpo no meio daquela folia. Era tdo o q queria. Sorriu como nunca fizera antes. Dançou como nunca havia dançado. Beijou concubinas travestidas de meninas. Passou suas mãos em bundas risonhas e desinibidas. Foi apalpado. Usado. Até se sentiu amado. Com algumas até de forma bem vagabunda.

A lembrança é divina loucura. É o inferno de um céu em chamas. É o resta para se beber do mel de um amor q passou, mas, q persiste em se manter, como na fogueira a brasa. Calor q não aquece e, no entanto, não se apaga. A lembrança vai e volta. Não desgruda. Nem qdo a fala grita: cala!

Qtos gritos. Qta ironia. Qtas certezas absurdas e surdas se transformam em incertezas mudas. Assim, ao som dos atabaques, bumbos e tamborins, ele percorreu por toda a noite a alegria de uma festa q lhe enchia os olhos, mas não preenchia o vazio, q insistia em ecoar no fundo de su’alma.

A lembrança é uma fada sem alma, a voar sem destino pelo próprio desatino. É o olhar q se fecha na tentativa de melhor se enxergar. É salto dado no mais completo escuro. É a procura de um gesto, sorriso incerto em q se tenta velejar.

No largo da amaralina ela surgiu meio na surdina. Por um instante ele pensou q era miragem ou efeito da bebida. Era tdo o q queria da vida. Encontrava-se, enfim, diante de seu tão esperado inesperado sonho. Naquela hora, tdo o mais em sua volta parecia bisonho.

Então, sem qq embaraço, vestiu sua roupa de palhaço e se deixou levar pelos encantados braços daquela sereia. Era noite de sexta-feira. A lua, enfim, iluminara seus desejos. Embriagado de paixão, ele deu pulos de alegria e desceu a ladeira sem perceber q começava a viver os primeiros acordes de seu derradeiro amor.

A lembrança arde diante da imagem da tarde q debruçava viço por todos os cantos da janela, deixando a noite deliciosamente preguiçosa. A lembrança é um açoite q sangra o tempo. Vento soprando forte na busca de algum norte.

A lembrança é esperança q se arrasta pela paisagem. Deserto de uma cidade fantasma, onde o pensamento persegue o cheiro do esgoto no cais de um porto desesperadamente alegre, sem escudo protetor contra a previsível dor.

Enquanto a vida segue inquieta mundo a fora, as lembranças saem à tua procura sem o menor pudor.


Depois de mtos beijos e abraços eles misturaram suas ilusões. Pareciam eufóricos ao cantar tanta emoção. Naquele instante não se preocuparam com nada. Nem mesmo se encontrariam harmonia, qdo o dia terminasse de cantar a última e ensolarada estrofe daquela canção:

“Procurando por você meu amor, mas que felicidade lhe encontrar rebolando na avenida, para desgraça e glória dessa vida... Deixa o coração bater até se despedaçar. Chora depois, mas agora deixa sangrar... Deixa o carnaval passar...”



Interferência proposital e justa de “Deixa sangrar”, de Caetano Veloso
Composição essencial sobre “Pierrot and Columbine” de Pablo Picasso